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  • Foto do escritorSINTUFF

Prisão de mandantes do assassinato de Marielle é vitória, mas ainda há muito a ser esclarecido

Uma das principais questões a serem ainda respondidas é sobre a rede criminosa que agiu para impedir elucidação do crime e com quais interesses. Marielle e Anderson, presentes!



Por CSP-Conlutas


Neste domingo (24), a prisão dos três suspeitos de terem encomendado e planejado o assassinato da ex-vereadora Marielle Franco, em 14 de março de 2018, teve o efeito de uma bomba no cenário político nacional. A execução, que também vitimou o motorista Anderson Gomes, revela um esquema criminoso que conta com a participação de políticos, milícia e polícia.


Foram detidos Domingos Brazão, atual conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ); Chiquinho Brazão, deputado federal, irmão e sócio de Domingos; e Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Figuras com ligações e relações estreitas no meio político no Rio de Janeiro, mas também nacionalmente.

A prisão acontece dias depois do anúncio de que o Supremo Tribunal Federal (STF) homologou o acordo de delação premiada do ex-policial militar e miliciano Ronnie Lessa, que foi o autor dos disparos que mataram Marielle e Anderson e está preso desde 2019.


A Operação Murder da Polícia Federal (PF), que prendeu os acusados, também cumpriu mais 12 mandados de busca e apreensão, autorizados pelo ministro do Supremo, Alexandre de Moraes. Nesta segunda-feira (25), a Primeira Turma do STF manteve a prisão preventiva dos acusados.


Questões fundiárias e interesses da milícia


Neste domingo, Alexandre de Moraes retirou o sigilo do relatório final da PF e, segundo as investigações, o motivo do crime estaria relacionado com disputas fundiárias no Rio de Janeiro, envolvendo grilagem e atuação de milícias.


Os irmãos Brazão, que representam um forte grupo político no RJ ligado a atividades criminosas, atuavam para regularização de lotes em bairros controlados por milícias na zona oeste da cidade. Marielle combatia a proposta, principalmente o chamado PL da Grilagem, que tratava do tema. As discussões para a execução do crime teriam começado ainda em 2017 e a promessa de “pagamento” a Lessa teriam sido lotes de terras griladas e invadidas pela organização criminosa comandada pelos irmãos Brazão e pela milícia.


Os investigadores mostram que o plano para executar Marielle contou com a participação fundamental do ex-chefe da polícia civil. Segundo a PF, ele “planejou meticulosamente” o crime, bem como atuou para obstruir posteriormente as investigações.


Rivaldo assumiu o cargo um dia antes da morte de Marielle. Antes ocupava a chefia do Departamento de Homicídios. Sua nomeação foi assinada pelo então interventor da Segurança do Rio de Janeiro, o general Braga Netto, que havia sido indicado pelo governo de Michel Temer. Braga Netto foi ex-ministro de Bolsonaro e candidato a vice-presidente nas eleições de 2022. A indicação de Rivaldo contrariou recomendação do próprio setor de inteligência da polícia.


Para a realização do crime, houve também a infiltração de um integrante da milícia carioca no PSOL para espionar Marielle.


Os irmãos Brazão


O nome de Domingos Brazão foi citado pela primeira vez por suspeitas de obstrução das investigações. Ele já foi deputado estadual e foi nomeado conselheiro do TCE-RJ no governo de Sérgio Cabral, em 2015. Dois anos depois, foi preso com todos os demais conselheiros por corrupção ligada ao governo e suspenso do TCE-RJ. Em 2021, o ministro Nunes Marques, mandou soltar Domingos Brazão e o autorizou a reassumir o cargo. Segundo a revista Veja, ele recebeu R$ 2 milhões em salários acumulados e teria ainda para receber mais R$ 581 mil em férias atrasadas.


Chiquinho Brazão foi vereador do Rio de Janeiro por 12 anos, período que engloba os dois primeiros anos de Marielle na Câmara, entre 2016 e março de 2018. Foi eleito pela primeira vez para a Câmara dos Deputados em 2018. Em 2022, foi reeleito para o cargo.


Em outubro do ano passado, mesmo com todas as suspeitas de envolvimento dos Brazão com o assassinato de Marielle, o prefeito carioca Eduardo Paes (PSD) nomeou Chiquinho como seu secretário especial de Ação Comunitária. Chiquinho deixou o cargo poucos dias após o anúncio da delação premiada de Ronnie Lessa.


Em 2019, o governo Bolsonaro, cuja relação com milicianos no Rio de Janeiro é notória, Chiquinho Brazão e toda sua família receberam passaportes diplomáticos. Aliás, o nome da família Bolsonaro, em vários momentos, esteve envolvido no caso.


Seis anos e tentativas de impedir a solução


A execução de Marielle completou seis anos no último dia 14. Seis longos anos durante os quais familiares, amigos, movimentos sociais e organizações da classe trabalhadora se mantiveram mobilizados para exigir respostas para as perguntas quem matou, quem mandou matar e por quê.


Mobilização, aliás, que foi fundamental para se chegar aos mandantes. Isso porque ao longo desse tempo, as investigações foram marcadas por várias trocas de comando da polícia e no Ministério Público, destruição de provas, obstruções, que já mostravam que havia falta de interesse em desvendar o crime.


Durante entrevista coletiva neste domingo, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou que a PF considera o caso como elucidado com a identificação dos mandantes. Mas familiares, como a viúva de Marielle, Mônica Benício, e a víuva de Anderson, Agatha Arnaus, e analistas políticos, avaliam que ainda há mais a ser desvendado.


‘Depois de 6 anos, é o mais perto que a gente já chegou. Espero que ainda avance muito mais. Não tem resposta clara ainda, não tem história completa. Ver que as pessoas que participaram no crime nos abraçaram, beijaram e prometeram solução, falaram até que era amigo…isso é um tapa na cara, é pisotear ainda mais. Ele olhou nos olhos, fez promessas. É tão doloroso. Não foram só os cinco presos, tem mais gente que colaborou de alguma forma. Falta muita coisa para a gente ter paz’”, disse Agatha.


Marielle e Anderson, presentes! A luta continua


O fato é que muitas questões ainda precisam de resposta, entre elas, quem são todos os envolvidos na obstrução das investigações durante todos esses anos? Afinal, Rivaldo sozinho não poderia ter interferido em tudo. Quem ajudou a dificultar as investigações, o fez por quais motivos e interesses?


O assassinato de Marielle demonstra que o crime contou com envolvimento de políticos, polícia, milícia, judiciário, numa grande organização criminosa que domina o Estado e atua em prol de seus interesses. Assim como a pressão e mobilização foram fundamentais para que a morte de Marielle e Anderson não fosse esquecida, será fundamental para exigir que as investigações avancem, apontem todos os envolvidos e garanta punição.

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